Minha mãe costumava fazer suspiros em casa quando éramos crianças. Ela fazia bastante e guardava-os num vidro bonito, dentro do armário, para nos dar aos poucos. Eu sempre descobria o esconderijo e, pra não dar na vista, roubava um aqui, outro ali, até acabar. O que eu mais gostava nos suspiros que ela fazia era que eles tinham uma casquinha sequinha e meio rosada, mas o interior era puxa-puxa, quase como um marshmallow. Eu aproveitava a rachadinha que sempre tinha nos suspiros pra quebrá-los ao meio e comer como um bombom Serenata de Amor, preservando o recheio pra comer por último.
Foi por isso que a idéia da Pavlova me encantou desde a primeira vez que ouvi falar do doce. O fato de ele ter sido criado, segundo contam, em homenagem à bailarina russa Anna Pavlova foi um plus, porque eu fiz 8 anos de ballet clássico quando criança. Eu aterrorizava as professoras da academia de dança, porque só fazia o que me dava na telha ao invés de seguir as instruções de aula. Algumas coisas nunca mudam... Não sei ao certo o motivo da homenagem a uma bailarina, mas provavelmente seja pela leveza do doce ou pela semelhança com um tchu-tchu, que é como se chama aquela saia de tule aramada que elas usam. O importante é que é um doce incrível.
Se não me engano, foi num programa da Nigella que eu tomei conhecimento dessa sobremesa. Nas primeiras tentativas, eu comprava uns suspiros prontos na padaria pra simular uma nos potes bonitos de servir que a minha mãe tem. Ficava interessante, mas eu estava sempre insatisfeita com o resultado, porque os suspiros de padaria eram muito secos e doces, sem o interior cremoso como eu gosto. Eram como suspiros de São Cosme e Damião, quando eu queria um interior mais parecido com a textura da Maria Mole, sabe como? Daí, algum tempo depois e a bênção da internet, eu achei a receita base da Nigella e resolvi fazer, pra nunca mais deixar essa delícia fora das festas. É a coisa mais simples de fazer no mundo, não precisa muita frescura pra deixar bonito porque a rusticidade ganha pontos. É um doce de casa. Já vi Pavlovas serem servidas em eventos e restaurantes, mas aí eles costumam fazê-las individuais e bonitinhas, branquinhas, com bico de confeitar. Eu gosto dessa porque é super cuca-fresca.
A cobertura tradicional é de creme chantilly, que eu já fiz milhares de vezes e fica ótimo, principalmente se não tiver açúcar, porque né? O merengue já tem. Frutas das mais variadas e coloridas podem ser usadas, mas as vermelhas costumam fazer a combinação de mais sucesso. Dessa vez eu resolvi que queria uma coisa mais fresca na sobremesa e decidi fazer um molho de limão siciliano pra colocar no lugar do creme de leite. Ficou simplesmente incrível! Contraste de texturas, doce, azedinho, crocante, o frecor da folha de hortelã... Depois que você aprende a fazer, cada vez você pode testar algo diferente. É importante dizer que quando a gente diz que uma sobremesa é fácil, não significa que ela possa ser feita de qualquer jeito. Dedique tempo pra fazer direito. Você não vai se arrepender!
Pavlova com molho de limão siciliano, framboesas e hortelã (rendimento: 14 pedaços)
8 claras
500g de açúcar refinado
60g de amido de milho
30ml de vinagre de vinho branco
7ml de essência/extrato de baunilha.
Modo de preparo:
Lembre-se de checar a altura da grade do seu forno antes de colocar o merengue, especialmente se estiver usando o tabuleiro de bolo de cabeça para baixo. Leve o merengue forno e baixe a temperadura para 120C/ 250F imediatamente depois que fechar a porta. Asse por uma hora e desligue o fogo depois disso, mantendo o suspiro gigante dentro do forno até que esfrie completamente. Você pode fazer a receita na noite anterior pra garantir. Quando esfriar, retire delicadamente o papel manteiga. você pode virar o merengue em outro prato, como se faz com os bolos, para descolar o papel com maior tranquilidade. Só que isso deverá ser feito com mãos de fada. MUITO CUIDADO NESTA HORA!!!!
Molho de Limão Siciliano
Raspas de 2 a 3 limões sicilianos (depende do tamanho)
350 ml de suco de limão siciliano coado e recém-espremido
150ml de água filtrada
8 gemas de ovos
30g de amido de milho
300g de açúcar refinado, mais quantidade à gosto para ajustar a seu paladar
30g de manteiga sem sal
Modo de fazer: numa panela funda misture, com a ajuda de um fouet, as gemas, o açúcar, o amido de milho, o suco de limão, as raspas e a água. Leve a mistura ao fogo até que ela engrosse, mexendo com uma colher sem parar. O ponto certo (napê) é quando você faz um risco nas costas da colher cheia de molho com o seu dedo indicador. Se as bordas do risco permanecem firmes, ou seja, o molho não fechar o risco nas costas da colher, está pronto. Retire do fogo e deixe esfriar. Molhos engrossados costumam formar uma película na superfície que não é desejável. A melhor forma de esfriar molhos assim, especialmente estes para confeitaria (ou mesmo cremes de confeiteiro), é levá-los à batedeira em potência mínima. Esta é a hora perfeita pra colocar os 30g de manteiga gelada, porque ela derreterá aos poucos com o calor do molho, incorporando lentamente, emulsionando e dando brilho. Bata até esfriar completamente. Guarde em pote de fechamento hermético, na geladeira, até a hora de montar a sobremesa pra servir.
Cobertura de Frutas:
340g de framboesas frescas e lavadas e bem secas
folhas de hortelã lavadas e bem secas
raspas de limão, se houver
Montagem: (A Pavlova deve ser montada na hora de comer, caso o contrário o molho tirará a crocância da casquinha do merengue e tudo ficará murcho.)
Com o merengue já posicionado no prato que você escolheu, coloque às colheradas o molho de limão gelado (misture um pouco antes, pra que ele fique macio e volte a ter consistência de molho, não de mingau). Espalhe por toda a superfície do merengue, preservando as bordas. Assim que terminar, coloque as framboesas por cima e espalhe as folhas de hortelã por cima. Sirva imediatamente.